VEJA Edição 2028 3 de outubro de 2007
A última do MST: cursos exclusivos em faculdades públicas – com o patrocínio do governo
Por Sebastião Moreira/AE
Eis algumas das diferenças entre um curso universitário feito sob medida para assentados do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e os demais. As aulas, sejam elas da faculdade de geografia ou pedagogia, começam com uma espécie de encenação teatral durante a qual os sem-terra fazem conclamações à luta contra as classes dominantes. As disciplinas são definidas em assembléias nas quais os alunos têm cadeira e direito a voto. Foi numa dessas reuniões que se decidiu incluir o espanhol no currículo de um curso de letras na Bahia. Os assentados reivindicavam aprender o idioma a pretexto de melhorar a comunicação com os "companheiros" dos países da América Latina. Entre as matérias que só eles têm, uma das descritas com maior entusiasmo é história dos movimentos sociais, que "narra a luta pela terra" desde o Brasil colônia. O calendário local também segue uma lógica própria. O 7 de Setembro, em que se celebra a independência do Brasil, foi transformado no "dia dos excluídos". Adoram-se – dentro e fora da sala de aula – Che Guevara e Karl Marx. Por tudo isso, esses cursos de ensino superior, exclusivos dos sem-terra, se distinguem dos oferecidos no restante do país.
Não é exatamente uma novidade o fato de o MST receber verbas do governo para educar seus integrantes. Na década de 80, o movimento pleiteou – e conseguiu – tornar públicas as escolas dos assentamentos, até então improvisadas sob lonas. Na década de 90, firmou convênios com faculdades públicas para cursos eventuais. Há dois anos, o MST criou a Escola Nacional Florestan Fernandes, espécie de universidade do movimento. O maior avanço, sem dúvida, veio com os novos cursos superiores. Com eles, os sem-terra estudam nas melhores faculdades do país, têm o privilégio da reserva de vagas e ainda por cima impõem um regime paralelo. No vestibular, são testados conhecimentos da cartilha do MST (veja alguns exemplos acima). Os assentados só entram na disputa por uma vaga com o aval dos líderes. Em sala de aula, onde se ensina um currículo aparentemente convencional, predomina o discurso anticapitalista e de ódio ao agronegócio. Dele, comungam os professores. Diz Gelcivânia Mota, do curso de pedagogia da Universidade do Estado da Bahia: "Os professores acreditam nas propostas dos movimentos sociais do campo".
Ensinar aos sem-terra uma visão dogmática do mundo já é por si só um problema, mas o quadro piora porque a catequese marxista se dá em universidades públicas – com patrocínio do governo. A meta do MST ao levar assentados à academia, afinal, é preparar gente para combater "o sistema" (aquele mesmo que os está bancando), e eles tratam abertamente do assunto. Segundo o livro A Política de Formação de Quadros, febre literária nos assentamentos do movimento, "quem não forma quadros dificilmente atinge seus objetivos estratégicos na revolução". É sempre bom saber que mais gente chega à universidade no Brasil. O problema, neste caso, é que ela está servindo a uma causa anacrônica – e não se presta ao papel fundamental de preparar jovens para atuar numa sociedade moderna.
O AVANÇO DO MST NO ENSINO SUPERIOR
Um novo levantamento do Ministério do Desenvolvimento Agrário mostra que o governo federal destina a cada ano mais verbas para cursos universitários exclusivos aos sem-terra.
Conclusão: o investimento do governo nesse tipo de curso cresceu 270% em quatro anos
O diploma é o mesmo.
Já o vestibular...
Para entrarem numa universidade pública, os sem-terra prestam um vestibular próprio. Eis algumas das questões extraídas da prova de múltipla escolha do curso de direito para assentados da Universidade Federal de Goiás
1 A relação entre estrutura fundiária e fome no Brasil decorre da...
A evolução tecnológica das pequenas propriedades nas áreas de fronteira
B modernização da agricultura, que gerou desemprego no campo
C concentração de latifúndios em regiões de solos mais pobres
D ineficiência do gerenciamento empresarial agrícola nas médias propriedades
2 Sob a lógica dos movimentos sociais no campo...
A a agricultura brasileira é latifundiária, sendo necessária sua modernização para que a terra cumpra sua função social
B o agronegócio é a forma de integração da agricultura familiar ao mercado capitalista
C a agricultura brasileira é latifundiária, sendo necessária sua superação pela agricultura de caráter familiar
D a agricultura brasileira tem caráter empresarial, portanto não há necessidade de reforma agrária
3 O "campo goiano" é representado por inúmeras manifestações culturais que desenvolvem uma diversidade de símbolos, dos quais...
A as festas são ritos provenientes da cultura cristã ocidental
B os causos de assombração e demônios desenvolvem o controle social através do medo
C as simpatias e as rezas justificam a distância dessa cultura com o mundo liberal
D a marca, o mutirão e o adjuntório aumentam a renda fundiária
Respostas: 1.b; 2.c; 3.b
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