Rodrigo Rangel - O Estado de S.Paulo
Ninguém fala abertamente, mas a posição hesitante do governo brasileiro em relação às Farc coloca em situação difícil os órgãos de segurança que, de alguma maneira, esbarram nas ações da guerrilha por aqui. Os investigadores se veem diante de um incômodo dilema. Avançar ou não? E se o governo não gostar?
A razão da preocupação é simples. Desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o Palácio do Planalto, o tema Farc é tabu. Brasília resiste firmemente às pressões de Bogotá e de Washington e não admite a possibilidade de classificar a guerrilha colombiana como organização terrorista. Em troca, as Farc dão mostras de que confiam no governo brasileiro: em duas oportunidades, a guerrilha aceitou que aeronaves militares do Brasil acompanhassem a Cruz Vermelha em delicadas missões de resgate de reféns na selva.
Para não entrar na briga, o governo argumenta que a guerrilha é um problema interno da Colômbia e que, por essa razão, não deve se intrometer.
O PT e a guerrilha já estiveram juntos no célebre Foro de São Paulo, conclave que reúne organizações de esquerda de toda a América Latina. É de lá a amizade que levou Raúl Reyes, número dois da guerrilha morto há dois anos num ataque militar da Colômbia, a escrever em 2003 ao recém-empossado Lula em busca de apoio para a causa das Farc. A mesma amizade permitia a Reyes manter contatos regulares via e-mail com alguns petistas, de dentro e de fora do governo.
É bem verdade que a guerrilha esperava mais de Lula. Talvez o mesmo apoio explícito que recebe de Hugo Chávez. Mas ela também não pode reclamar. Que o diga Olivério Medina, o padre das Farc a quem o Brasil concedeu refúgio político a despeito de sucessivos pedidos de extradição formulados pela Colômbia, onde ele é acusado de homicídio e sequestro.
Nessa simpatia envergonhada do governo pode estar a explicação para o fato de, mesmo diante de tantas evidências, ter demorado tanto tempo para que se mapeasse, para valer, a ação das Farc em território brasileiro.
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